terça-feira, 12 de maio de 2020

Simplicidade

Certa vez estava andando por uma cidade quando vi, em uma parada de ônibus, uma frase que dizia "a simplicidade é o último grau de sofisticação". A primeira coisa que pensei foi algo mais ou menos assim: "bah, mas que besteira!". Acho que besteira mesmo foi ter pensado isso sem ter refletido no sentido da frase antes de tentar discordar dela. Ainda bem que está dentro das regras da vida mudar de opinião de vez em quando. Para falar a verdade, eu pessoalmente já mudei bastante ao longo desta vida.

Eu não sei exatamente quem disse tal frase, mas pensando sobre isso hoje em dia, me vejo analisando a simplicidade com muito mais cuidado do que outrora tinha e com quase atenção suficiente que ela merece. Parece um desejo natural nosso tentar fugir da simplicidade como se ela fosse algo terrível. Talvez seja terrível mesmo o sentimento que ela produz de que não somos indivíduos únicos e que a complexidade nos faz superiores aos outros indivíduos que, teoricamente, são simples demais para dedicarmos nossa atenção. Mas a simplicidade não procede de um reducionismo onde a busca pelo melhor é substituída por ornamentos preguiçosos. A simplicidade não deleta propriedades intrínsecas do indivíduo e se compõe pela ausência de criatividade.

Estou me referindo aqui da simplicidade de uma pessoa e seus atos, sua linguagem, honestidade. Não de estruturas fundamentais do Universo. Não devemos confundir aqui o ser simples com o ser simplista. O simplista é na verdade aquele que tenta reduzir o irredutível, tentando dar soluções demasiadas breves para problemas milenares! É como tentar  resolver um problema psicológico tal como borderline, ou ainda uma correlação EPR, com uma regra de 3: não vai dar certo e ainda quase ninguém será convencido. Explicar é rastrear as causas. 

Um dos mais importantes conceitos de simplicidade é a famosa Navalha de Ockham, que diz que "as pluralidades não devem ser multiplicadas sem necessidade". É um tanto fácil perceber a razão pela qual este princípio é fundamental tanto no método científico quanto no cotidiano. Uma fórmula simples sobre alguma teoria qualquer deve ser preferida àquela formulação extremamente complexa e que diz a mesma coisa. Isso acontece por que as condições de verificabilidade são evidenciadas na formulação mais simples; o que não ocorre na mais complexa, ainda que diga a mesma coisa. A probabilidade de engano no instante da verificação é menor quando se trata de algo mais simples. Um problema que ocorre é que nem sempre é tão fácil de produzir simplicidade enquanto se está tratando de temas complexos. No cotidiano, isso também é verdadeiro. Imagine, por exemplo, que alguém tente lhe dar algum golpe, apresentando alguma possibilidade de benefício muito grande pela troca de algum outro produto ou serviço a ser trocado. Deve-se querer saber o que se trata antes de tomar decisão e, se não está simples o suficiente, alguém acaba sendo persuadido ou decide que tudo deve ser melhor esclarecido.

Há necessidade, acima de tudo, de pessoas simples. Que não ficam se emaranhando em coisas vãs e improdutivas o tempo todo. Pessoas que não ficam, como o personagem Sherlock Holmes sugere, no livro "Um estudo em escarlate", poluindo constantemente suas mentes para coisas desnecessárias. São pessoas assim que tornam a vida mais agradável, textos mais acessíveis, teorias mais verificáveis, problemas mais solucionáveis, e assim por diante.