Quando pensamos sobre a natureza daquilo que é Belo, deixamos de lado as outras coisas que julgamos não ser. Se por acaso dizemos que em tal coisa não há Beleza alguma, estamos na verdade dizendo que em outro lugar há. Se tentamos aniquilar o conceito de Belo negando critérios objetivos como fundamentação daquilo que é Belo, de nenhuma forma se está sendo refutado que há coisas Belas, ainda que o método científico ou alguma teoria verificacionista não pode provar a validade da Beleza. A questão é que tomarei por evidente aqui a existência de algo da qual denominamos Beleza para, então, meditar um pouco sobre sua utilidade.
Um grande problema que parece surgir quando refletimos sobre a Beleza é que ela parece prima facie inútil. Parece na verdade que ela não tem uma utilidade pública ou particular, como abastecer reservatórios de água ou ainda realizar uma cirurgia de ponte de safena. E realmente parece ser o caso que a Beleza não serve pra essas coisas, a menos que alguém creia que a Beleza por si só pode religar artérias do coração de alguém. Bem, eu não creio nisso também.
Mas eu não estou argumentando que a Beleza serve pra tudo (e também desconheço se há quem assim argumente). Ninguém falou que a finalidade da Beleza é resolver uma Conjectura de Goldbach ou reduzir os impostos. Isso seria muito bom inclusive, mas não creio que devemos desprezar uma música clássica por que ela não resolve os problemas da corrupção. Creio que utilizar exemplos particulares contingentes para fazer uma generalização é uma péssima forma de utilizar o raciocínio.
Muito bem, vamos lá. Qual é então a finalidade da Beleza? Já sabemos para o que ela não serve, e a lista pode ser muito grande! Já tendo uma noção do que o Belo significa para nós, precisamos agora apontar algumas coisas que exemplificam a necessidade de coisas belas na vida do ser humano. Vou tentar ilustrar um ou outro exemplo da finalidade da Beleza.
Considere por exemplo, uma pessoa que fará a cirurgia de ponte de safena. Por que exatamente ela quer continuar vivendo? Ora, se o Belo também é manifestação do Bem, como colocou Platão, então essa pessoa tem boas razões para preferir a vida do que se entregar à morte. Essa pessoa quer melhorar seu estado de saúde para contemplar o belo durante um tempo mais extenso. Ela quer se relacionar ainda mais com as pessoas que ela gosta e estender seus instantes de relacionamento com essas pessoas tanto quanto aquilo que é naturalmente belo. Talvez ela queira visitar lugares agradáveis aos seus olhos tal como um parque onde há pássaros cantando, ou ainda uma obra de arte.
Não estou argumentando que precisamos necessariamente estar sob pena de morte para encontrar uma finalidade na Beleza. A Beleza como expressão sensível também nos alegra diariamente, com toda suas variadas formas de expressões que, sendo o caso de estarmos tristes, podemos encontrar algum consolo por estas infinitas coisas Belas que podemos presenciar. A Beleza satisfaz não somente nossos olhos quando estes contemplam a ordenação da natureza ou leem o Soneto 116 de William Shakespeare; nem tão somente os ouvidos quando apreciam uma boa música como Comptine d'un autre été. Mas tanto os olhos quanto os ouvidos direcionam o que é belo à alma, que contempla e se alegra com tantos sentimentos que podem ser expressos pelas infinitas, mas não exaustivas formas de Beleza dispostas em nosso mundo. A Beleza educa a alma.
Um lugar que me chama bastante atenção sobre a significância da Beleza é a Bíblia Cristã. Há alguns trechos específicos que podem clarear um pouco aquilo que eu entendo de significante para a utilidade da Beleza; mas também a Bíblia expressa sua própria razão de argumentar em favor da existência do que é belo. "Os olhos não se fartam de ver, nem os ouvidos de ouvir", é o que diz Eclesiastes. A Beleza é uma dessas coisas que dão sentido à vida e tal é a razão que nossos olhos não se cansam de ver, nem nossos ouvidos se cansam de ouvir. Mas sempre procurando aquilo que é belo e agradável de se contemplar e ouvir, evitando-se as coisas que são irritantes aos nossos olhos e ouvidos.
Quem é que não se alegra ao olhar o céu estrelado durante a noite? Bem, há muitas pessoas que nem mesmo olham para o céu estrelado, talvez por suas cidades serem poluídas o suficiente para não conseguirem enxergar muita coisa, ou ainda por realmente não se interessarem por tal tipo de coisa. O fato de poucas pessoas se interessarem por um céu estrelado pode estar relacionado à péssima influência das mídias sociais, uma vez que não se pode tirar "selfies" com a Lua ou fazer outro tipo dessas coisas que estão na moda. O fato é que eu realmente duvido que as pessoas que ignoram a Beleza conseguem possuir verdadeira felicidade, se é que o Belo está relacionado com o Bem e com uma verdadeira contemplação das coisas que são perceptíveis aos nossos sentidos e agradáveis à nossa alma.
É também lamentável o fato de que muitas de nossas cidades são horrorosas. Tanto prédios e casas são feias e desorganizadas quanto os fios de energia elétrica, outdoors e outras coisas das ruas deixam uma péssima vontade de caminhar por esses lugares. Dá uma tristeza ainda maior quando essas disposições arquitetônicas são somadas ao péssimo gosto musical de algumas outras pessoas. Bem, mas isso tudo não significa que não há qualquer coisa bela disposta para nossos olhos e ouvidos. Acredito que basta se interessar um pouco mais sobre o que a Beleza pode proporcionar para a alma, e isso não é algo que se pode encontrar em qualquer texto (eu julgo que esse texto aqui ainda não está perto o suficiente de ser belo) ou simples fotos do Google. Acredito que valha mais a pena seus olhos e ouvidos buscarem coisas belas além do computador ou celular, pode ser mesmo o caso que a Beleza sirva para alguma coisa.
"Uma é a glória do sol, outra, a glória da lua, e outra, a das estrelas; porque até entre estrela e estrela há diferenças de esplendor" (1 Co 15:41).
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